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A chegada de Jesus Cristo em Olinda
Na Sexta-Feira Santa de 1998
Marcos Cordeiro
Sexta-feira
santa em Olinda.
Os
sinos mudos pelo sagrado luto
cedem
soluços às matracas roucas
na
Igreja de Nossa Senhora da Graça
do
Seminário dos Jesuitas.
Mais
ao longe, em coro, outras respondem:
Na
Sé do Salvador do Mundo, e no Convento de São Francisco.
No
Convento da Misericórdia e no Recolhimento da Conceição.
No
Mosteiro do Monte e na Igreja do Amparo dos Homens Pardos.
Também
na Igreja de São João dos Militares
e
em Nossa Senhora do Rosário dos Pretos do Bonsucesso
e,
mais adiante, em Nossa Senhora do Guadalupe.
Descendo
a colina da Misericórdia
ouve-se
o lamento de outras matracas:
da
Igreja do Senhor Bom Jesus do Bonfim,
de
Nossa Senhora da Boa Hora e do Carmo.
De
São Sebastião e São Pedro Apóstolo,
Mosteiro
de São Bento e Convento do Desterro
e
junto às ondas do mar Atlântico
As
da Igreja da Santa Cruz dos Milagres
e
da Capelinha de São José do Ribamar.
Logo
cedo em procissão
muitos,
em toda parte,
escondendo-se
de suas vias trágicas,
O
viram, caminhando num andor de lágrimas,
pelas
duas Beiras e por Évora.
Passou
em Castela e Andaluzia.
Após
Leon e após Sevilha,
penitente
e peregrino aqui chegou, a Pernambuco.
Passando
pela devoção de toda a gente,
após
Sertânia, Jabitacá e Conceição da Pedra
em
Olinda, na sua Sé, Ele chegou.
Na
velha Sé o eco fúnebre se anuncia
nos
bombardinos e trompas de harmonia.
Os
tambores surdos se proclamam altos
e
marciais abrem alas à passagem
do
Santo Cristo – o mesmo de Ipojuca,
pelas
ladeiras e ruas de Olinda.
Carregando
a sua humana cruz,
sobre
o andor que se move na cadência
do
ritmado toque dos tambores,
Jesus
avista além da clara Olinda
as
águas mornas e os mangues soterrados
de
um bravo rochedo – o Recife libertário.
Mais
além ainda, as altas nuvens
e
os altos montes das batalhas
de
Pernambuco pela liberdade
no
solo rubro dos Guararapes.
O
vento esvoaçante nas palmeiras
dançarinas
da Praça do Carmo,
acaricia
ternamente as sabiás
que
habitando céus e campanários
veem,
contritas, o Salvador passar.
As
vozes lamentosas dos fiéis
sobre
as ladeiras e outeiros de Olinda
penetram
o tempo antigo dos beirais,
sob
as arcadas seculares de calcário.
Bordado
em ouro e de veludo roxo
o
Santo Cristo sob um dossel de flores
começa
a caminhada por Olinda.
Saindo
do alto da Sé segue o cortejo.
Da
Misericórdia vai ao rumo dos seus passos,
pelas
capelas erguidas na cidade:
Passo
da Sé, Amparo, Quatro Cantos,
Passo
do Senhor Apresentado ao Povo
e
o Passo da Ribeira.
Nas
varandas e muxarabis
colchas
bordadas e brocados ricos
fazem
cenário ao divino caminhante
no
seu cortejo de rei e apenado
por
ter nascido homem
e
por isso condenado:
A
ser traído, julgado e assassinado,
por
seus algozes – irmãos ou aliados,
ou
mesmo pelo mais vil destino.
Os
que o levam entre flores e cetins,
dizendo
preces, cantos e louvores,
logo
mais, na primeira hora
a
outro Cristo farão sofrer,
outro
tormento, outro julgamento,
para
morrer outra vez crucificado
como
Esse que nas ruas de Olinda
relembra
aos tolos e aos esquecidos
a
paixão e morte de todos os homens.
Ao
longe, os ventos fugitivos do Atlântico
no
pentagrama dos coqueiros dos Milagres,
rege
alegremente sanhaçus e bem-te-vis,
que
isentos de pecados, crimes e certezas,
saúdam
um pobre caminhante.
Parabens Marcos por esse belo passeio/procissão pelas igrejas e ladeiras de Olinda e pela beleza de mais um poema.
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